A minha
vizinha nunca leu Simone de Beauvior. Não conhece Emma Goldman e muito menos já
ouviu falar sobre Audre Lorde. A minha vizinha não é acadêmica, nem preta
cotista e o máximo que conseguiu chegar, foi até o primário e por contra gosto
do pai: "preta minha não vai estudar!".
A minha vizinha não sabe o que é direitos humanos. Já levou cuspe na
cara, chute na barriga, três abusos e um filho no bucho. A minha vizinha
trepou com um sujo.
Já foi chamada de nega, vagaba, macaca. Inclusive pelos homens de farda.
A minha vizinha não sabe o que é sororidade, às vezes chora de saudade do filho
que perdeu, pura sacanagem!
A minha vizinha não é culta. Sempre foi chamada de puta. Jogada na rua,
cresceu na labuta. Já foi faxineira, cozinheira, prostituta. Ê mulher de
luta!
Sabe que nem sempre a vida é justa, mas ela busca. Onde ela vive, não
existe lei Maria da Penha que a proteja de ser mãe "solteira, diarista e
detenta".
Essa mulher tá abalada.
Aaaah, mas o eurocentrismo ainda a mata.
Tá preparada: hoje vai largar o emprego e ir para o sambódromo (é o
jeito), interpretar a mulata. Coitada..."
Texto: Lorena Cristina
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